Byron em Sintra
A partir dos anos 60, Carlos Calvet desenvolve uma linguagem singular na pintura. A herança da experiência surrealista (que acompanhou no final dos anos 40) articula-se com o mundo obscuro e irracional do princípio de cálculo PI, e com a numerologia. Acresce também o fascínio pela estética pop. Nesta obra figurativa surgem, em primeiro plano, um conjunto de seis cerejas (6, número perfeito e triangular de 3, como defende nos estudos que desenvolveu sobre PI) que afirmam a forma geométrica da esfera. As cerejas, elemento trivial, surpreendem, no seu vermelho vivo, pelo excesso de protagonismo, de dimensão fantástica, como que a gravitar em formações triangulares. No fundo cenográfico inscreve-se, de forma ilusória, uma paisagem de bilhete-postal que parece aludir à Serra de Sintra de Lord Byron, recortada sobre um fundo azul nublado que se abre num plano rectangular, seguro pelos fantasmagóricos dedos de uma mão. É uma composição desconcertante pela relação entre os elementos, que co-existem, no entanto, num pacificante jogo visual de cores e volumes.
Adelaide Ginga